Recentemente li uma postagem no blog de Roger Olson sobre como alguém não tem que concordar com Armínio para ser um Arminiano. Ela pode ser encontrada aqui.
Olson fez vários apontamentos positivos no artigo, e ele certamente está correto em sua afirmação principal de que alguém pode diferir dos pontos mais sutis de Armínio e ainda ser um Arminiano. Apesar de seu desejo de abrir um espaço para Teístas Abertos no campo Arminiano, o que, claro, teria sido muito problemático para Armínio, é uma boa e instigante postagem. Concordo especialmente com sua opinião de que o Molinismo é inconsistente com o Arminianismo.
No entanto, a principal coisa que me chamou a atenção sobre o ensaio de Olson foi o seu comentário sobre as opiniões de Armínio sendo uma espécie de “sinergismo evangélico” (um termo que toma emprestado de Donald Bloesch). Assim, ele diz, mais de uma vez, que os Anabatistas como Balthasar Hubmaier e Menno Simons eram precursores de Armínio neste molde “sinergista evangélico”.
Eu costumava pensar nesse mesmo sentido. Um dos meus primeiros artigos publicados foi intitulado “Um Batista Livre na Reforma”, e era sobre o Anabatista Balthasar Hubmaier do século XVI – aquele grande Anabatista que afirmava o livre-arbítrio libertariano, lava-pés, e o credobatismo, que teve também uma opinião sobre a Igreja e o Estado muito mais parecido com Thomas Helwys e os Batistas Ingleses no século seguinte do que com os Anabatistas do seu próprio século.
Mas foi quando eu estava fazendo um artigo do seminário de doutorado sobre a soteriologia dos Batistas primitivos, John Smyth e Thomas Helwys, para o professor Richard Greaves, da Florida State University, que comecei a ver uma diferença entre o sinergismo de John Smyth, que se tornou um Menonita soteriologicamente, e as visões muito mais orientadas pela graça de Thomas Helwys. Ele se separou de Smyth em grande parte porque este último havia adotado as visões Menonitas e deixado para trás mais visões Reformadas do pecado original e da justificação pela justiça imputada de Cristo.
Helwys nunca teria desejado ser chamado de sinergista. Ele queria evitar qualquer indício de cooperar ou trabalhar junto com Deus na salvação. Ele até não gostava do termo livre-arbítrio! Comecei a ver, em grande parte através da obra de Alvin Beachy, sobre o conceito da graça na Reforma Radical, que as noções Anabatistas de graça, incluindo as de Hubmaier, Meno e Smyth, eram semi-pelagianas, ao contrário das de Helwys ou Jacó Armínio[i].
Comecei a me afastar do uso da palavra sinergista e passei a acreditar que pensadores como Armínio e Helwys, os quais tinham uma ênfase muito maior da graça em sua soteriologia e doutrinas da depravação e incapacidade humanas do que os Anabatistas tinham quanto à mesma.
Recentemente me deparei com um livro, Jacob Arminius: Theologian of Grace [Jacó Armínio: Teólogo da Graça], que argumentava que o próprio Armínio era sinergista. Os autores, Thomas McCall e Keith Stanglin, dizem: “Alguns eruditos negam que Armínio seja um ‘sinergista’, mas sua definição de graça subsequente é precisamente ‘sinérgica’, que é simplesmente o equivalente grego de ‘cooperativa’ (derivada do latim).” O principal culpado para ele, citado na nota de rodapé, sou eu[ii].
Como meu colega do Welch College, Robert Picirilli, não creio que Armínio se chamava ou jamais se teria chamado de sinergista por causa das implicações semi-pelagianas do termo. Isso implica que as pessoas estão trabalhando em conjunto com Deus para realizar sua salvação. Os próprios Stanglin e McCall citam a pessoa de Agostinho alguns parágrafos depois, usando a mesma linguagem da graça cooperativa subsequente usada por Armínio. O uso de Armínio desta mesma frase não o torna um “sinergista”, e ele não teria ficado confortável com o termo.
Eu diria, de Arminínio, o que Gregory Graybill diz do associado de Martinho Lutero, Filipe Melâncton em sua recente monografia Evangelical Free Will [Livre-arbítrio Evangélico]. A conversão em Melâncton, insiste Graybill, “era um passivo recebimento de mérito, em vez de um trabalho cooperativo ativo que ganhava mérito. Não era sinergismo!” Graybill distingue a visão de Melâncton da de Pedro Lombardo, que “exigia que Deus e o ser humano trabalhassem juntos em sinergia”. Assim como é injusto para os teólogos Luteranos atribuir um termo a Melâncton que foi prontamente associado aos seus seguidores posteriores, é ainda mais injusto selar Armínio com um termo que ele não empregou e que era estranho ao seu contexto teológico[iii].
Stanglin, com razão, repreende os estudiosos por importarem categorias dogmáticas descontextualizadas para o entendimento de Armínio, que estão longe de seu contexto. Mas acho que selar Armínio com a designação “sinergista”, quando estava tão distante de suas próprias categorias e terminologias teológicas reformadas, é descontextualizar o pensamento de Armínio.
Eu acho que a abordagem de Picirilli e Arthur Skevington Wood é preferível: as opiniões de Armínio não representam “uma forma de sinergia na qual a obra de Deus e a obra do homem cooperam, mas sim uma relação na qual a vontade e a obra de Deus são acolhidas em uma atitude de confiança e submissão”[iv]. Armínio teria ficado muito mais confortável com a linguagem usada por meu colega da Welch College, Leroy Forlines, que, em seu livro Classic Arminianism [Arminianismo Clássico], usa a terminologia "monergismo condicional" em vez de sinergismo[v]. Essa abordagem é compartilhada por eruditos na obra de Armínio como Carl Bangs e William den Boer, bem como de Episcópio, pelo erudito Mark Ellis[vi].
Essa mesma linha de pensamento é seguida por eruditos como Kenneth Keathley e Jeremy Evans, do Southeastern Seminary, e Richard Cross, de Notre Dame. Em vários escritos, esses senhores defendem o “monergismo com graça resistível”. Tanto Evans quanto Keathley se apegaram ao argumento de Richard Cross em seu artigo “Anti-Pelagianism and the Resistibility of Grace [Anti-Pelagianismo e a Resistibilidade da Graça]”.[vii]
Cross questiona: “Suponha que adotemos [...] que não pode haver cooperação humana ativa natural na justificação. Tal posição exigiria que aceitássemos a irresistibilidade da graça?” (Evans, 260). Cross, junto com Keathley e Evans, acha que não. Evans chama isso de “monergismo com resistibilidade da graça”. Keathley e Evans citam o “modelo ambulatorial” de Cross, segundo o qual o pecador é como uma pessoa inconsciente que é resgatada por paramédicos e acorda em uma ambulância e não resiste às ações dos paramédicos do SAMU para salvar sua vida.
Essa tentativa de manter uma posição de livre-arbítrio libertário sobre a soberania divina e a liberdade humana evitando a noção de sinergismo me lembra o desejo de Armínio de manter “a maior distância possível do pelagianismo”.[viii] Evans observa que essa abordagem significa que “a única contribuição de uma pessoa não é de um estado pessoal positivo, como sustentam os fios de Pelagianismo e Semi-Pelagianismo”, porque a salvação é “operada por Deus” (Ef 2:8-9). Então, as pessoas não “se levantam por si mesmas”. Em vez disso, a fé salvadora é um “dom dado livremente de cima e não reside em nenhuma capacidade natural da pessoa” (Filip. 1:28-29). Além disso, Evans sustenta, afirmando que o monergismo, juntamente com a graça resistível, “ajuda a explicar como Deus deseja que nenhum pereça (ITim. 2:3)” (Evans, 261).
Então, acho que é uma boa ideia para os Arminianos encontrarem maneiras de evitar a terminologia do sinergismo. Eu acho que estudiosos como Forlines, Picirilli, Wood, Bangs, Den Boer, Ellis, Cross, Keathley e Evans têm bons instintos em querer ficar longe disso. E julgo que Armínio (e Helwys) teria concordado.
Traduzido em Português por Ícaro Alencar de Oliveira. Rio Branco, Acre, em 25 de junho de 2018.
Fonte: <https://welch.edu/are-arminians-necessarily-synergists-2/>
NOTAS:
[i] Beachy, The Concept of Grace in the Radical Reformation [O Conceito da Graça na Reforma Radical] (Nieuwkoop: B. De Graaf, 1977).
[ii] Stanglin e McCall, Jacob Arminius: Theologian of Grace [Jacó Armínio: Teólogo da Graça] (New York: Oxford UP, 2012), 152-53.
[iii] Graybill, Evangelical Free Will: Phillipp Melanchthon’s Doctrinal Journey on the Origins of Faith [Livre-Arbítrio Evangélico: Trajeto de Filipe Melâncton sobre as Origens da Fé] (Oxford: Oxford UP, 2010), 297.
[iv] Picirilli citando Wood com aprovação em Grace, Faith, Free Will [Graça, Fé, Livre-arbítrio] (Nashville: Randall House, 2002), 162. Veja Wood, The Declaration of Sentiments: The Theological Testamento of Arminius [A Declaração dos Sentimentos: O Testamento Teológico de Arminius], Evangelical Quarterly 65 (1993), 111- 29.
[v] F. Leroy Forlines, Classical Arminianism: A Theology of Salvation [Arminianismo Clássico: Uma Teologia de Salvação] (Nashville: Randall House, 2011), 264, 297.
[vi] Bangs, "Arminius e Reformed Theology" [Armínio e a Teologia Reformada] dissertação de doutorado, Universidade de Chicago, 1958 (onde ele afirma corajosamente, "Armínio era um monergista" [166]); den Boer, "Cum delectu": Jacob Arminius's Praise and Critique of Calvin and His Theology" ["Cum delectu: Elogio e Crítica de Jacó Armínio de Calvino e sua Teologia], Church History and Religious Culture 91 (2011) (2011), 83-84; veja também den Boer, God's Twofold Love: The Theology of Jacob Arminius [O Duplo Amor de Deus: A Teologia de Jacó Armínio] (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 2010); Ellis, Simon Episopius' Doctrine of Original Sin [A Doutrina do Pecado Original de Simão Episcópio] (Nova York: Peter Lang, 2006), 84. Essa perspectiva concorda com o que Richard Muller disse em uma obra anterior: “É difícil rotular [a abordagem de Armínio] de sinergismo” (Muller, “The priority of the Intellect in the oteriology of Jacobus Arminius" [A Prioridade do Intelecto na Soteriologia de Jacó Armínio],” Westminster Theological Journal 55 [1993], 70. Em um artigo mais recente, no entanto, Muller caracteriza Armínio como um sinergista: “Arminius and the Reformed Tradition [Armínio e a Tradição Reformada]”, 29).
[vii] Cross, “Anti-Pelagianism and the Resistibility of Grace [O Anti-Pelagianismo e a Resistibilidade da Graça],” Faith and Philosophy 22 (2005), 199-210; Keathley, Salvation and Sovereignty: A Molinist Approach [Salvação e Soberania: Uma Abordagem Molinista] (Nashville: B&H Academic, 2010), 88, 103-08; Evans, “Reflections on Determinism and Human Freedom [Reflexões sobre o Determinismo e a Liberdade Humana],” em Whosoever Will: A Biblical-Theological Critique of Five-Point Calvinism (Nashville: B&H Academic, 2010), 253-74; cf. Kevin Timpe, “Grace and Controlling What We Do Not Cause [Graça e o Controle do que não Causamos],” Faith and Philosophy 24 (2007), 284-99.
[viii] The Works of James Arminius [As Obras de Jacó Armínio] (Nashville: Randall House, 2007), 1:764.