PATRIARCAS DA IGREJA PRIMITIVA
Os documentos mais antigos da Igreja Primitiva (incluindo o cânon do NT) refletem um claro pré-milenialismo. Mas uma discussão menor cerca a relação do arrebatamento com a Tribulação. Os pré-tribulacionistas apontam para a clara crença da Igreja Primitiva na iminência como sinal de que o pré-tribulacionismo em defendido por pelo menos alguns daqueles que viveram nos tempos mais antigos.
Como era típico em todas as áreas da teologia da Igreja Primitiva, os pontos de vista iniciais de profecia não estavam desenvolvidos e as vezes eram contraditórios, contendo um campo fértil para desenvolvimento de vários e diversos pontos de vista teológicos. Encontrar um pré-tribulacionismo claro “soletrado” pelos patriarcas da Igreja Primitiva e difícil, mas alguns elementos pré-tribulacionais são nítidos. Quando sistematizados com os seus outros pontos de vista proféticos, estes elementos contradizem o pós-tribulacionismo e apóiam o pré-tribulacionismo. Por exemplo, os patriarcas apostólicos ensinavam claramente a característica pré-tribulacional da iminência da volta do Senhor Jesus Cristo.
Um exame superficial dos patriarcas da Igreja Primitiva revela que eles eram predominantemente pré-milenialistas ou quiliastas. Existem claros exemplos nos escritos de Barnabé (100—105), Papias (60—130), Justino Mártir (110—165), Irineu (120—202), Tertuliano (145—220), Hipólito (185—236), Cipriano (200-250), e Lactâncio (260—330). Os patriarcas da Igreja Primitiva esperavam fervorosamente que a Igreja estivesse sofrendo e sendo perseguida quando o Senhor voltasse. No entanto, eles também acreditavam no retorno
iminente de Cristo, que é uma característica central do pensamento pré-tribulacional. Esta falta de precisão tem levado a um debate entre os estudiosos quanto a como interpretar os escritos dos patriarcas da Igreja Primitiva.
Expressões de iminência abundam nos patriarcas apostólicos. Clemente de Roma (90—100), Inácio de Antioquia (98—117), O Didaquê [A instrução dos doze apóstolos] (100— 160), A Epístola de Barnabé (117—138), e O Pastor de Hermas (96—150) — todos falam da iminência. Suas afirmações têm abundância de exortações para “vigiar” , “esperar", e “estar preparado” para a vinda do Senhor em breve. Além disso, O Pastor de Hermas (1.4.2) fala de escapar da Tribulação:
Vós escapastes da Grande Tribulação em virtude da vossa fé, e porque não duvidastes na presença de tal Besta. Ide, portanto, e contai aos eleitos do Senhor os seus atos poderosos, e dizei a eles que esta Besta é um tipo da Grande Tribulação que esta se aproximando. Se então vos preparardes, e vos arrependerdes de todo o vosso coração, e vos converterdes ao Senhor, será possível escapardes dela; sim, se o vosso coração for puro e imaculado, e passardes o resto dos dias das vossas vidas servindo ao Senhor irrepreensivelmente.
No entanto, ninguém, pode produzir uma afirmação clara de escatologia patrística a respeito do arrebatamento. Mas podemos concluir o seguinte:
- Eles esperavam uma vinda literal de Cristo seguida de um reino de mil anos literal.
- Eles acreditavam na vinda iminente de Cristo com ocasionais inferências pré-tribulacionais.
- Eles estavam sendo perseguidos pelo governo romano, mas não equipararam isto com a futura ira tribulacional.
Larry Crutchfield (p. 77) corretamente conclui,
Esta opinião dos patriarcas sobre a iminência, e, nos escritos de alguns, referências a encapar do tempo da Tribulação, constitui o que pode ser definido, para citar Erickson, “sementes das quais a doutrina do arrebatamento pré-tribulacional poderia se desenvolver [...]” Se não fosse pelo enfraquecimento da exegese sadia, trazida pelo alegorismo alexandriano e mais tarde por Agostinho, questiona-se que tipo de produto estas sementes poderiam ter gerado — muito antes de J. N. Darby e do século XIX.
A IGREJA MEDIEVAL
O período entre Agostinho e a Renascença foi amplamente dominado pelo “entendimento que Agostinho possuía da Igreja, e a sua espiritualização do Milênio como o reinado de Cristo nos santos”. Havia apenas “discussões esporádicas aqui e ali de um Milênio futuro e literal” (Hannah, pp. 315-316), tomando os exemplos do pré-tribulacionismo muito raros. No entanto, uma pesquisa histórica cuidadosa revelou muitas afirmações pré-tribulacionais há muito negligenciadas.
Efrém de Nisíbis (306—373)
Efrém era um escritor extremamente importante e prolífico. Também conhecido como Pseudo-Efrém, ele foi um grande teólogo da antiga Igreja Oriental (Bizantina). O seu importante sermão “Nos Últimos Dias, o Anticristo e o Fim do Mundo” (c. 373) declara: “Todos os santos e eleitos de Deus serão reunidos antes da Tribulação que está por vir, e serão levados ao Senhor, para que em nenhum momento possam ver a confusão que domina o mundo por causa dos nossos pecados”.
Neste sermão, Pseudo-Efrém desenvolve uma elaborada escatologia bíblica, incluindo uma distinção entre o arrebatamento e a segunda vinda de Cristo. Ela descreve o Arrebatamento Iminente, seguido por uma Grande Tribulação de três anos e meio de duração sob o governo do Anticristo, seguido pela vinda de Cristo, a derrota do Anticristo, e o estado eterno. O seu ponto de vista inclui um parêntesis entre o cumprimento da sexagésima nona e a septuagésima semana de Daniel (Dn 9.24-27). Pseudo-Efrém descreve o arrebatamento como “iminente” e precedendo a Tribulação.
Codex Amiatinus (690—716)
Este manuscrito latino significativo da Inglaterra foi comissionado por Abbot Ceolfrid, dos mosteiros de Jarrow e Wearmouth em Northumberland. No título do Salmo 22 (Salmo 23 na Vulgata), aparece o seguinte: “Salmo de Davi, a voz da Igreja depois de ser arrebatada”. A frase latina post raptismum contém um verbo da raiz rapio, significando “capturar, ou sair correndo”. Este título não é transportado a partir da Vulgata de Jerônimo e assim é provavelmente o produto do mosteiro Jarrow. Embora não conclusivo e ainda necessitando de um estudo adicional, parece que o Codex Amiatinus apresenta um outro exemplo de pensamento pré-tribulacional na Idade Media.
Irmão Dolcino (1307)
Um estudo recente do texto do século XIV, A Historia do Irmão Dolcino, composto em 1316 por uma fonte anônima, revela outra importante passagem pré-tribulacional. Como líder dos Irmãos Apostólicos no norte da Itália, o Irmão Dolcino conduziu o seu povo através de tempos de tremenda perseguição papal. Uma pessoa deste grupo escreveu as seguintes palavras espantosas:
O Anticristo estava entrando neste mundo dentro dos limites do dito período de três anos e meio; e depois de sua vinda então ele [Dolcino] e seus seguidores seriam transferidos para o Paraíso, no qual estão Enoque e Elias. E desse modo seriam preservados ilesos da perseguição do Anticristo.
Assim, o escritor desta História acreditava que Dolcino e seus seguidores seriam transferidos para o paraíso, expressando esta crença com a palavra latina transferrentur, ou “trasladação”, um sinônimo de arrebatamento. Dolcino e seus seguidores se retiraram para as montanhas do norte da Itália para aguardarem a sua remoção por ocasião do aparecimento do Anticristo.
Acredita-se que [os grupos cristãos dos] Albigenses, Lombardos, e os Waldenses foram atraídos para o pré-milenialismo, mas pouco se conhece dos detalhes de suas crenças desde que os católicos destruíram as suas obras, quando foram encontradas.
Francis Gumerlock é o indivíduo que defende a opinião sobre o arrebatamento do Irmão Dolcino. Gumerlock (p. 80) escreveu: “Os dolcinitas defendiam uma teoria de arrebatamento pré-tribulacional semelhante á mesma teoria no dispensacionalismo moderno”. A importância dessas antigas afirmações é que elas claramente contradizem aqueles que têm tentado dizer que as afirmações sobre o arrebatamento não existiram antes de 1830. Gumerlock (p. 361) acredita que esta é uma afirmação do arrebatamento pré-tribulacional, e ele conclui:
Este parágrafo de A História do Irmão Dolcino indica que no norte da Itália, no início do século XIV, um ensino muito semelhante ao pré-tribulacionismo moderno estava sendo pregado. Respondendo às condições políticas e eclesiásticas angustiantes, Dolcino travou especulações detalhadas sobre escatologia e acreditava que a vinda do Anticristo era iminente. Ele também acreditava que o meio pelo qual Deus protegeria o seu povo da perseguição do Anticristo seria através de um traslado dos santos para o paraíso.
A ERA DA REFORMA
Depois de mais de mil anos de supressão, o pré-milenialismo começou a ser revivido como resultado de pelo menos quatro fatores. Primeiro, os Reformadores voltaram para os patriarcas bíblicos e apostólicos. Isto os expôs a um pré-milenialismo ortodoxo. Especialmente significativo foi o reaparecimento do texto completo de Contra Heresias, de Irineu (incluindo os últimos cinco capítulos), que adota um futurismo consistente e lança a septuagésima semana de Daniel no futuro.
Segundo, eles repudiavam boa parte da alegorização que dominava a hermenêutica medieval adotando uma abordagem mais literal, especialmente na área da exegese gramatical e histórica.
Terceiro, muitos dos protestantes entraram em contato com os judeus e aprenderam hebraico, o que os levou a perguntar se as passagens que falam da nação de Israel deveriam ser tomadas histórica ou alegoricamente na tradição da Idade Media.
Quarto, começando no final do século XV, a tradução da Bíblia nas línguas nativas do povo, pela primeira vez desde os dias da Igreja Primitiva, produziu uma explosão de leitura bíblica pelo publico em geral. Isto resultou em um conhecimento geral da Bíblia, especialmente do AT, pela primeira vez na historia da Igreja. Visto que o AT fala primeiramente de Israel, levou apenas algumas décadas para as pessoas começarem a pensar em Israel e em seu futuro. Isto também contribuiu para um reavivamento do pré-milenialismo.
Joseph Mede (1586—1638) é considerado o pai do pré-milenialismo inglês, tendo escrito Clavis Apocalyptica (Chave do Apocalipse) em 1627, em que “ele tentou construir um esboço do Apocalipse baseado somente em considerações internas. Nesta Interpretação, ele defendeu o pré-mileniallsmo de um modo tão erudito que esta obra continuou a influenciar a interpretação escatológica por seculos” (Clouse, p. 646).
Increase Mather (1639—1723), presidente do Harvard College (1685), foi um importante puritano americano. No que diz respeito à futura vinda de Cristo, ele escreveu que os santos “seriam apanhados nos ares” com antecedência, desse modo escapando da batalha final. Outros começaram a falar do arrebatamento. Paul Benware (pp. 197-198) observa:
O Reformador francês Peter Jurieu, em seu livro Approaching Deliverance of the Church [Livramento Futuro da Igreja] (1687), ensinou que Cristo viria nos ares para arrebatar os santos e voltaria para o céu antes da batalha do Armagedom. Ele falou de um arrebatamento secreto antes da sua vinda em glória e do juízo no Armagedom. Ambos os comentários de Philip Doddridge sobre o NT (1738) e de John Gill sobre o NT (1748) usaram o termo arrebatamento e falaram deste como iminente. Fica claro que estes homens acreditavam que esta vinda precedera a descida de Cristo à terra e o tempo do juízo. James Macknight (1763) e Thomas Scott (1792) ensinaram que os justos serão transportados para o céu, onde estarão seguros até que o tempo do juízo termine.
A mais clara referência (se não a mais desenvolvida) pré-Darby, de um arrebatamento pré-tribulacional vem de Morgan Edwards (1722—1795), que via um arrebatamento distinto ocorrer três anos e meio antes do inicio do Milênio. Edwards foi um pregador, evangelista, historiador e educador batista que fundou a Rhode Island College (Brown University). Durante os seus dias de estudante no Seminário Batista Bristol na Inglaterra (1742—1744), ele escreveu uma dissertação sobre a profecia bíblica. A dissertação foi publicada na Filadélfia, em 1788, como Dois Exercícios Acadêmicos sobre Assuntos que Levam os Seguintes Títulos: Milênio, Últimas Novidades. Edwards escreveu: “A distância entre a primeira e a segunda ressurreição será de pouco mais de mil anos [...] devido ao fato de que os santos mortos serão ressuscitados, e os vivos transformados na ‘manifestação’ ou ‘aparecimento’ de Cristo ‘nos ares’ (1Ts 4-17)”.
- Ele acredita que passarão mais de mil anos entre as ressurreições.
- Ele associa a primeira ressurreição com o arrebatamento de 1 Tessalonicenses 4.17.
- Ele associa o encontro dos crentes com Cristo nos ares com João 14.2.
- Ele vê os crentes desaparecendo no céu durante o período da Tribulação.
Não há dúvida de que Morgan Edwards era um pré-tribulacionista, aproximadamente cem anos antes de Darby.
A IGREJA MODERNA
Quando o futurismo começou a substituir o historicismo dentro dos círculos pré-mileniais nos anos de 1820, os proponentes modernos do pré-tribulacionismo dispensacional entraram em cena. Por volta de 1818, William Witherby elaborou um trabalho que tinha virtualmente todas ai características do futurismo moderno. John Nelson Darby (1800—1882) afirma ter entendido pela primeira vez o seu ponto de vista do arrebatamento, como resultado de um estudo bíblico pessoal feito durante um período de convalescença na casa de sua irmã, ocorrido de dezembro de 1826 a janeiro de 1827. Foi ele quem popularizou a versão moderna da doutrina de um arrebatamento pré-tribulacional.
A doutrina do arrebatamento espalhou-se pelo mundo através do Movimento Brethren (“Irmaos”), do qual Darby era associado. Parece que através dos seus escritos, ou através das visitas pessoais à America do Norte, esta versão de pré-tribulacionismo propagou-se, chegando a todos os evangélicos americanos. Dois antigos proponentes deste ponto de vista incluem o presbiteriano James H. Brookes (1830—1897) e o batista J. R. Graves (1820— 1889).
A posição pré-tribulacional se espalhou através da influencia da era da Conferência Bíblica Niágara (NY, 1878—1909), e recebeu uma ampla exposição nas populares publicações proféticas The Truth, Our Hope, The Watchword, e Maranatha. Ela também foi divulgada no livro de William Backstone chamado Jesus is Coming (1909), na popular Scofield Reference Bible (1909) de C. I. Scofield, e outras obras. Proeminentes professores bíblicos pré-tribulacionais articularam a posição no circuito da conferência bíblica nos séculos XIX e XX, incluindo Arno C. Gaebelein (1861—1945), A. J. Gordon (1836—1895), James M. Cray (1851—1935), R. A. Torrey (1856—1928), Harry Ironside (1876—1951), John F. Strombeck (1881—1959), Lewis Sperry Chafer (1871—1952), Alva J. McClain (1888—1968), Charles Lee Feinberg (1909—1995), J. Dwight Pentecost, John F. Walvoord (1910—2002), Charles Ryrie, e Tim LaHaye.
Durante os últimos 120 anos, várias escolas, faculdades e diversos seminários foram estabelecidos expondo o pré-tribulacionismo dispensacional. Estes incluem Moody Bible Institute, Biola University, Philadelphia Biblical University, Dallas Theological Seminary, Grace Theological Seminary, Liberty University, Bob Jones University, Master’s College and Seminary, e outros. O pré-tribulacionismo também é uma grande posição doutrinária em muitas igrejas batistas, presbiterianas, pentecostais, e bíblicas independentes. Na frente popular, nada tem feito mais para promover a posição do arrebatamento pré-tribulacional do que a obra Late Great Planet Earth (1970) de Hal Lindsay e a serie de 12 volumes Left Behind (1995—2004) de Tim LaHaye e Jerry Jenkins.
Por Thomas Ice e James Stitzinger
BIBLIOGRAFIA
Benware, Paul. Understanding End Times Prophecy. Chicago: Moody Press, 1995.
Clouse, Robert C. “Joseph Mede (I 586—1638)”. Em The New International Dictionary of the Christian Church. Ed. J. D. Douglas, ed. rev. Crand Rapids: Zonervan, 1978.
Crutchfield, Larry. “The Blessed Hope and the Tribulation in the Apostolic Fathers”. Em When the Trumpet Sounds. Eds. Timothy Demy e Thomas Ice. Eugene, OR: Harvest House Publishers, 1995.
Gumerlock, Francis. “A Rapture Citation in the Fourteenth Century". Bibliotheca Sacra. Vol. 159, n° 635 (2002).
Hannah, John. Our Legacy: The History of Christian Doctrine. Colorado Springs: Nav-Press, 2001.
Stitzinger, James. “The Rapture in Twenty Centuries of Biblical Interpretation". Master’s Seminary Journal, 13.2 (Outono de 2002), pp. 149-171.
Fonte: LAHAYE, Tim; HINDSON, Ed. Enciclopédia Popular de Profecia Bíblica. Rio de Janeiro: CPAD, 2010. pp. 89-94.
Os críticos do arrebatamento pré-tribulacional frequentemente citam a falta de base histórica desta visão. Por vários anos, os oponentes da posição do arrebatamento pré-tribulacional tem argumentado que este foi inventado por John Darby, em meados dos anos de 1800, e que jamais foi mencionado antes disso. Argumentos como este geralmente alegam que, pelo fato de o ensino ter menos de duzentos anos, ele não pode ser bíblico, ou os crentes teriam defendido este ponto de vista muitos anos antes. Em última análise, a verdade bíblica deve ser determinada pelo claro ensino das Escrituras, e não pelo modo como o ensino tem sido visto ao longo da historia. No entanto, uma quantidade substancial de evidências revela uma crença no arrebatamento pré-tribulacional muito antes de John Darby.
PATRIARCAS DA IGREJA PRIMITIVA
Os documentos mais antigos da Igreja Primitiva (incluindo o cânon do NT) refletem um claro pré-milenialismo. Mas uma discussão menor cerca a relação do arrebatamento com a Tribulação. Os pré-tribulacionistas apontam para a clara crença da Igreja Primitiva na iminência como sinal de que o pré-tribulacionismo em defendido por pelo menos alguns daqueles que viveram nos tempos mais antigos.
Como era típico em todas as áreas da teologia da Igreja Primitiva, os pontos de vista iniciais de profecia não estavam desenvolvidos e as vezes eram contraditórios, contendo um campo fértil para desenvolvimento de vários e diversos pontos de vista teológicos. Encontrar um pré-tribulacionismo claro “soletrado” pelos patriarcas da Igreja Primitiva e difícil, mas alguns elementos pré-tribulacionais são nítidos. Quando sistematizados com os seus outros pontos de vista proféticos, estes elementos contradizem o pós-tribulacionismo e apóiam o pré-tribulacionismo. Por exemplo, os patriarcas apostólicos ensinavam claramente a característica pré-tribulacional da iminência da volta do Senhor Jesus Cristo.
Um exame superficial dos patriarcas da Igreja Primitiva revela que eles eram predominantemente pré-milenialistas ou quiliastas. Existem claros exemplos nos escritos de Barnabé (100—105), Papias (60—130), Justino Mártir (110—165), Irineu (120—202), Tertuliano (145—220), Hipólito (185—236), Cipriano (200-250), e Lactâncio (260—330). Os patriarcas da Igreja Primitiva esperavam fervorosamente que a Igreja estivesse sofrendo e sendo perseguida quando o Senhor voltasse. No entanto, eles também acreditavam no retorno
iminente de Cristo, que é uma característica central do pensamento pré-tribulacional. Esta falta de precisão tem levado a um debate entre os estudiosos quanto a como interpretar os escritos dos patriarcas da Igreja Primitiva.
Expressões de iminência abundam nos patriarcas apostólicos. Clemente de Roma (90—100), Inácio de Antioquia (98—117), O Didaquê [A instrução dos doze apóstolos] (100— 160), A Epístola de Barnabé (117—138), e O Pastor de Hermas (96—150) — todos falam da iminência. Suas afirmações têm abundância de exortações para “vigiar” , “esperar", e “estar preparado” para a vinda do Senhor em breve. Além disso, O Pastor de Hermas (1.4.2) fala de escapar da Tribulação:
Vós escapastes da Grande Tribulação em virtude da vossa fé, e porque não duvidastes na presença de tal Besta. Ide, portanto, e contai aos eleitos do Senhor os seus atos poderosos, e dizei a eles que esta Besta é um tipo da Grande Tribulação que esta se aproximando. Se então vos preparardes, e vos arrependerdes de todo o vosso coração, e vos converterdes ao Senhor, será possível escapardes dela; sim, se o vosso coração for puro e imaculado, e passardes o resto dos dias das vossas vidas servindo ao Senhor irrepreensivelmente.
No entanto, ninguém, pode produzir uma afirmação clara de escatologia patrística a respeito do arrebatamento. Mas podemos concluir o seguinte:
- Eles esperavam uma vinda literal de Cristo seguida de um reino de mil anos literal.
- Eles acreditavam na vinda iminente de Cristo com ocasionais inferências pré-tribulacionais.
- Eles estavam sendo perseguidos pelo governo romano, mas não equipararam isto com a futura ira tribulacional.
Larry Crutchfield (p. 77) corretamente conclui,
Esta opinião dos patriarcas sobre a iminência, e, nos escritos de alguns, referências a encapar do tempo da Tribulação, constitui o que pode ser definido, para citar Erickson, “sementes das quais a doutrina do arrebatamento pré-tribulacional poderia se desenvolver [...]” Se não fosse pelo enfraquecimento da exegese sadia, trazida pelo alegorismo alexandriano e mais tarde por Agostinho, questiona-se que tipo de produto estas sementes poderiam ter gerado — muito antes de J. N. Darby e do século XIX.
A IGREJA MEDIEVAL
O período entre Agostinho e a Renascença foi amplamente dominado pelo “entendimento que Agostinho possuía da Igreja, e a sua espiritualização do Milênio como o reinado de Cristo nos santos”. Havia apenas “discussões esporádicas aqui e ali de um Milênio futuro e literal” (Hannah, pp. 315-316), tomando os exemplos do pré-tribulacionismo muito raros. No entanto, uma pesquisa histórica cuidadosa revelou muitas afirmações pré-tribulacionais há muito negligenciadas.
Efrém de Nisíbis (306—373)
Efrém era um escritor extremamente importante e prolífico. Também conhecido como Pseudo-Efrém, ele foi um grande teólogo da antiga Igreja Oriental (Bizantina). O seu importante sermão “Nos Últimos Dias, o Anticristo e o Fim do Mundo” (c. 373) declara: “Todos os santos e eleitos de Deus serão reunidos antes da Tribulação que está por vir, e serão levados ao Senhor, para que em nenhum momento possam ver a confusão que domina o mundo por causa dos nossos pecados”.
Neste sermão, Pseudo-Efrém desenvolve uma elaborada escatologia bíblica, incluindo uma distinção entre o arrebatamento e a segunda vinda de Cristo. Ela descreve o Arrebatamento Iminente, seguido por uma Grande Tribulação de três anos e meio de duração sob o governo do Anticristo, seguido pela vinda de Cristo, a derrota do Anticristo, e o estado eterno. O seu ponto de vista inclui um parêntesis entre o cumprimento da sexagésima nona e a septuagésima semana de Daniel (Dn 9.24-27). Pseudo-Efrém descreve o arrebatamento como “iminente” e precedendo a Tribulação.
Codex Amiatinus (690—716)
Este manuscrito latino significativo da Inglaterra foi comissionado por Abbot Ceolfrid, dos mosteiros de Jarrow e Wearmouth em Northumberland. No título do Salmo 22 (Salmo 23 na Vulgata), aparece o seguinte: “Salmo de Davi, a voz da Igreja depois de ser arrebatada”. A frase latina post raptismum contém um verbo da raiz rapio, significando “capturar, ou sair correndo”. Este título não é transportado a partir da Vulgata de Jerônimo e assim é provavelmente o produto do mosteiro Jarrow. Embora não conclusivo e ainda necessitando de um estudo adicional, parece que o Codex Amiatinus apresenta um outro exemplo de pensamento pré-tribulacional na Idade Media.
Irmão Dolcino (1307)
Um estudo recente do texto do século XIV, A Historia do Irmão Dolcino, composto em 1316 por uma fonte anônima, revela outra importante passagem pré-tribulacional. Como líder dos Irmãos Apostólicos no norte da Itália, o Irmão Dolcino conduziu o seu povo através de tempos de tremenda perseguição papal. Uma pessoa deste grupo escreveu as seguintes palavras espantosas:
O Anticristo estava entrando neste mundo dentro dos limites do dito período de três anos e meio; e depois de sua vinda então ele [Dolcino] e seus seguidores seriam transferidos para o Paraíso, no qual estão Enoque e Elias. E desse modo seriam preservados ilesos da perseguição do Anticristo.
Assim, o escritor desta História acreditava que Dolcino e seus seguidores seriam transferidos para o paraíso, expressando esta crença com a palavra latina transferrentur, ou “trasladação”, um sinônimo de arrebatamento. Dolcino e seus seguidores se retiraram para as montanhas do norte da Itália para aguardarem a sua remoção por ocasião do aparecimento do Anticristo.
Acredita-se que [os grupos cristãos dos] Albigenses, Lombardos, e os Waldenses foram atraídos para o pré-milenialismo, mas pouco se conhece dos detalhes de suas crenças desde que os católicos destruíram as suas obras, quando foram encontradas.
Francis Gumerlock é o indivíduo que defende a opinião sobre o arrebatamento do Irmão Dolcino. Gumerlock (p. 80) escreveu: “Os dolcinitas defendiam uma teoria de arrebatamento pré-tribulacional semelhante á mesma teoria no dispensacionalismo moderno”. A importância dessas antigas afirmações é que elas claramente contradizem aqueles que têm tentado dizer que as afirmações sobre o arrebatamento não existiram antes de 1830. Gumerlock (p. 361) acredita que esta é uma afirmação do arrebatamento pré-tribulacional, e ele conclui:
Este parágrafo de A História do Irmão Dolcino indica que no norte da Itália, no início do século XIV, um ensino muito semelhante ao pré-tribulacionismo moderno estava sendo pregado. Respondendo às condições políticas e eclesiásticas angustiantes, Dolcino travou especulações detalhadas sobre escatologia e acreditava que a vinda do Anticristo era iminente. Ele também acreditava que o meio pelo qual Deus protegeria o seu povo da perseguição do Anticristo seria através de um traslado dos santos para o paraíso.
A ERA DA REFORMA
Depois de mais de mil anos de supressão, o pré-milenialismo começou a ser revivido como resultado de pelo menos quatro fatores. Primeiro, os Reformadores voltaram para os patriarcas bíblicos e apostólicos. Isto os expôs a um pré-milenialismo ortodoxo. Especialmente significativo foi o reaparecimento do texto completo de Contra Heresias, de Irineu (incluindo os últimos cinco capítulos), que adota um futurismo consistente e lança a septuagésima semana de Daniel no futuro.
Segundo, eles repudiavam boa parte da alegorização que dominava a hermenêutica medieval adotando uma abordagem mais literal, especialmente na área da exegese gramatical e histórica.
Terceiro, muitos dos protestantes entraram em contato com os judeus e aprenderam hebraico, o que os levou a perguntar se as passagens que falam da nação de Israel deveriam ser tomadas histórica ou alegoricamente na tradição da Idade Media.
Quarto, começando no final do século XV, a tradução da Bíblia nas línguas nativas do povo, pela primeira vez desde os dias da Igreja Primitiva, produziu uma explosão de leitura bíblica pelo publico em geral. Isto resultou em um conhecimento geral da Bíblia, especialmente do AT, pela primeira vez na historia da Igreja. Visto que o AT fala primeiramente de Israel, levou apenas algumas décadas para as pessoas começarem a pensar em Israel e em seu futuro. Isto também contribuiu para um reavivamento do pré-milenialismo.
Joseph Mede (1586—1638) é considerado o pai do pré-milenialismo inglês, tendo escrito Clavis Apocalyptica (Chave do Apocalipse) em 1627, em que “ele tentou construir um esboço do Apocalipse baseado somente em considerações internas. Nesta Interpretação, ele defendeu o pré-mileniallsmo de um modo tão erudito que esta obra continuou a influenciar a interpretação escatológica por seculos” (Clouse, p. 646).
Increase Mather (1639—1723), presidente do Harvard College (1685), foi um importante puritano americano. No que diz respeito à futura vinda de Cristo, ele escreveu que os santos “seriam apanhados nos ares” com antecedência, desse modo escapando da batalha final. Outros começaram a falar do arrebatamento. Paul Benware (pp. 197-198) observa:
O Reformador francês Peter Jurieu, em seu livro Approaching Deliverance of the Church [Livramento Futuro da Igreja] (1687), ensinou que Cristo viria nos ares para arrebatar os santos e voltaria para o céu antes da batalha do Armagedom. Ele falou de um arrebatamento secreto antes da sua vinda em glória e do juízo no Armagedom. Ambos os comentários de Philip Doddridge sobre o NT (1738) e de John Gill sobre o NT (1748) usaram o termo arrebatamento e falaram deste como iminente. Fica claro que estes homens acreditavam que esta vinda precedera a descida de Cristo à terra e o tempo do juízo. James Macknight (1763) e Thomas Scott (1792) ensinaram que os justos serão transportados para o céu, onde estarão seguros até que o tempo do juízo termine.
A mais clara referência (se não a mais desenvolvida) pré-Darby, de um arrebatamento pré-tribulacional vem de Morgan Edwards (1722—1795), que via um arrebatamento distinto ocorrer três anos e meio antes do inicio do Milênio. Edwards foi um pregador, evangelista, historiador e educador batista que fundou a Rhode Island College (Brown University). Durante os seus dias de estudante no Seminário Batista Bristol na Inglaterra (1742—1744), ele escreveu uma dissertação sobre a profecia bíblica. A dissertação foi publicada na Filadélfia, em 1788, como Dois Exercícios Acadêmicos sobre Assuntos que Levam os Seguintes Títulos: Milênio, Últimas Novidades. Edwards escreveu: “A distância entre a primeira e a segunda ressurreição será de pouco mais de mil anos [...] devido ao fato de que os santos mortos serão ressuscitados, e os vivos transformados na ‘manifestação’ ou ‘aparecimento’ de Cristo ‘nos ares’ (1Ts 4-17)”.
- Ele acredita que passarão mais de mil anos entre as ressurreições.
- Ele associa a primeira ressurreição com o arrebatamento de 1 Tessalonicenses 4.17.
- Ele associa o encontro dos crentes com Cristo nos ares com João 14.2.
- Ele vê os crentes desaparecendo no céu durante o período da Tribulação.
Não há dúvida de que Morgan Edwards era um pré-tribulacionista, aproximadamente cem anos antes de Darby.
A IGREJA MODERNA
Quando o futurismo começou a substituir o historicismo dentro dos círculos pré-mileniais nos anos de 1820, os proponentes modernos do pré-tribulacionismo dispensacional entraram em cena. Por volta de 1818, William Witherby elaborou um trabalho que tinha virtualmente todas ai características do futurismo moderno. John Nelson Darby (1800—1882) afirma ter entendido pela primeira vez o seu ponto de vista do arrebatamento, como resultado de um estudo bíblico pessoal feito durante um período de convalescença na casa de sua irmã, ocorrido de dezembro de 1826 a janeiro de 1827. Foi ele quem popularizou a versão moderna da doutrina de um arrebatamento pré-tribulacional.
A doutrina do arrebatamento espalhou-se pelo mundo através do Movimento Brethren (“Irmaos”), do qual Darby era associado. Parece que através dos seus escritos, ou através das visitas pessoais à America do Norte, esta versão de pré-tribulacionismo propagou-se, chegando a todos os evangélicos americanos. Dois antigos proponentes deste ponto de vista incluem o presbiteriano James H. Brookes (1830—1897) e o batista J. R. Graves (1820— 1889).
A posição pré-tribulacional se espalhou através da influencia da era da Conferência Bíblica Niágara (NY, 1878—1909), e recebeu uma ampla exposição nas populares publicações proféticas The Truth, Our Hope, The Watchword, e Maranatha. Ela também foi divulgada no livro de William Backstone chamado Jesus is Coming (1909), na popular Scofield Reference Bible (1909) de C. I. Scofield, e outras obras. Proeminentes professores bíblicos pré-tribulacionais articularam a posição no circuito da conferência bíblica nos séculos XIX e XX, incluindo Arno C. Gaebelein (1861—1945), A. J. Gordon (1836—1895), James M. Cray (1851—1935), R. A. Torrey (1856—1928), Harry Ironside (1876—1951), John F. Strombeck (1881—1959), Lewis Sperry Chafer (1871—1952), Alva J. McClain (1888—1968), Charles Lee Feinberg (1909—1995), J. Dwight Pentecost, John F. Walvoord (1910—2002), Charles Ryrie, e Tim LaHaye.
Durante os últimos 120 anos, várias escolas, faculdades e diversos seminários foram estabelecidos expondo o pré-tribulacionismo dispensacional. Estes incluem Moody Bible Institute, Biola University, Philadelphia Biblical University, Dallas Theological Seminary, Grace Theological Seminary, Liberty University, Bob Jones University, Master’s College and Seminary, e outros. O pré-tribulacionismo também é uma grande posição doutrinária em muitas igrejas batistas, presbiterianas, pentecostais, e bíblicas independentes. Na frente popular, nada tem feito mais para promover a posição do arrebatamento pré-tribulacional do que a obra Late Great Planet Earth (1970) de Hal Lindsay e a serie de 12 volumes Left Behind (1995—2004) de Tim LaHaye e Jerry Jenkins.
Por Thomas Ice e James Stitzinger
BIBLIOGRAFIA
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Fonte: LAHAYE, Tim; HINDSON, Ed. Enciclopédia Popular de Profecia Bíblica. Rio de Janeiro: CPAD, 2010. pp. 89-94.