Belo Horizonte, 22 de Outubro de 1958
Amado irmão Enéas
Saudações no Senhor Jesus Cristo
Isaías 43:19
Escrevo-lhe, meu irmão, para informá-lo de que alguma coisa gloriosa está acontecendo em nossa Pátria. Estou voltando do Seminário do Sul, no rio, depois de uma semana de trabalhos especiais com os seminaristas, a convite do grêmio, onde estudamos a doutrina do Espírito Santo.
Na Sexta-Feira pela manhã, o Senhor nos visitou com grande poder, levando ao altar quase todos os seminaristas. Na noite do dia seguinte, cerca de 50 seminaristas se reuniram na biblioteca para uma reunião de oração. Depois do cântico de alguns hinos, foi lido um trecho da Bíblia e começamos a orar. Todos se mostravam submissos e desejosos de Deus. Por volta da quarta oração, aconteceu pentecostes.
O Espírito caiu sobre a casa, possuindo muitos. Alguns seminaristas se deixaram cair no chão, outros por sobre as mesas, outros se levantaram e muitos confessavam pecados em voz alta, ouvindo-se gemidos e sons de choro incontido.
Atordoado pela surpresa do acontecido, levantei-me dos meus joelhos e pensei fechar os basculantes da sala e tomar qualquer medida que evitasse que o barulho chegasse até as casas vizinhas.
Mas logo me senti repreendido pelo Espírito e deixei-me ficar no meu lugar, e entrando, eu mesmo, a participar da reunião.
Que experiência Enéas!... Quando pedi que todos se levantassem, encerrando o período de oração, os seminaristas se abraçam possuídos de grande emoção, os rostos molhados de lágrimas. Era cerca de 1:30 da manhã, e fora tudo como se apenas cinco minutos se tivessem passados.
Voltamos a louvar o Senhor, iniciando com o cântico do hino “Chuvas de Bênçãos”. Todos cantavam num clima de muita alegria e vibração. Findo o período de cânticos, começaram a pedir a palavra. Ora um, ora outro; e as confissões mais inesperadas e confissões mais tocantes tiveram lugar.
Em seguida, voltamos a orar. Recomeçou a visitação do Espírito. Muitos sentiam-se cheios de poder do Espírito, e com tal intensidade que alguns pediam ao Senhor que parasse a visitação, o Batismo do Espírito. Alguns podiam conter a emoção e andavam pelo salão rindo livremente.
Que espetáculo Enéas!... Assim como um banquete do céu na terra, o mosto do céu! O Apóstolo tem razão: “Enchei-vos do Espírito” Um dos seminaristas teve uma visão de Jesus, na glória. Agarrava-se a mim, enquanto dizia: Estou vendo o amado Salvador, não quero abrir os olhos, Pastor!
Quando terminaram as orações, era cerca de quatro horas da manhã. Passou o tempo como um sopro. Fomos para a capela do seminário, onde encerramos os trabalhos da semana.
Meu amado irmão, maravilhas ainda estão por vir. Já estávamos no domingo. Naquela manhã fui pregar na Igreja de Tauá, na Ilha do governador, que o pastor João Figueiredo pastoreava.
O pastor Figueiredo assistira a reunião do Seminário e fizera a entrega de sua vida a Deus. Depois da mensagem, onde senti a poderosa unção do Senhor, pedi que todos se levantassem para orar. Por volta da quarta oração, o Espírito de Deus desceu sobre a casa, igual como no Seminário, e logo almas foram atiradas diante do altar, aos gritos e soluços, confessando os pecados. Homens, mulheres, velhos e crianças, quebrantados ante a presença terrível do Senhor.
O pastor correu até ao púlpito ao meu lado, trêmulo de emoção e poder. Eu disse-lhe: Toma conta da tua Igreja, irmão, pois acaba de receberes o teu pentecostes e eu ainda preciso pregar em Zumbi.
O carro já me esperava na porta. Quando saí pela porta dos fundos, um homem veio ao meu encontro de braços abertos, e agarrou-me, aos soluços, marcado pela angústia. Era, creio, um diácono da igreja.
Cheguei ao carro, e uma senhora, de boa presença, tendo uma criança na mão, veio ao meu encontro dizendo: Senhor, nunca vi coisa igual. É a primeira vez que entro numa igreja protestante. Sinto-me transformada. Chamei um moço que passou assisti-la.
O pastor Figueiredo, cheio de poder, naquele mesmo dia foi à sua igreja, em Mesquita, uma igreja de pobres operários. Quando lá chegou, contou das maravilhas que o Senhor operara, e o Espírito desceu sobre todos, idêntico às vezes anteriores, e quebrantou a igreja.
Enéas, para mim foi tudo muito inesperado. Podemos proclamar: começou o avivamento em nossa Pátria. A reação já se faz sentir. Um professor do Seminário já culpou o reitor por ter aberto as portas do Seminário a um herético. As discussões já começam a surgir. O sentimentalismo, a emoção barata, tem sido chamado para justificar o ocorrido. Aqueles seminaristas eram antes racionais que simplórios; o mesmo que aconteceu com eles, aconteceu com humildes irmãos de Tauá e ainda melhor, de Mesquita.
Enéas, Deus continua quebrantado pastores. Três estão nas mãos do Espírito. Em Maceió. Em São Paulo também. Meu amado irmão, espero tanto na sua influência e decisão nesta hora. Um seminarista, ovelha sua, falou-me do irmão com tanto amor e gratidão. Disse-me que o seu Pastor é outro homem. Falou-me de um seu sermão 2 Crônicas 7:14.
Enéas, estamos prontos para o martírio nesta hora desafiante? Será que termos forças para sermos dignos? O irmão pode usar esta carta como desejar. Escrevo livremente, de coração para coração. Espero em novembro estar com o irmão e conversaremos sobre o trabalho. Com o abraço do conservo em Cristo,
José Rego do Nascimento.
(TOGNINI, ALMEIDA, 2007, p. 55-57).